sexta-feira, 29 de maio de 2009

Carta a um amigo.

A menos de uma semana fui surpreendido por um convite de um amigo – talvez ele ainda nem saiba que o considero como tal – para escrever um texto em seu blog. Confesso que, junto com a excitação, náuseas me atacaram em socos o estômago. Escrever? Sobre o quê? Para ele não interessava. Tive liberdade para escolher o tema e a forma com que iria discorrer sobre ele, o que só aumentou a minha aflição. Por fim, deixei que a proposta caísse no esquecimento momentâneo até que se fizesse madura por si e viesse à tona.

Em uma das minhas caminhadas para “espairecer” – seria mais correto chamar de uma tentativa desesperada de pôr os pensamentos em ordem – deparei-me com questionamentos que, no correr de duas semanas permeavam todo o meu mundo: amizade.

Alguém, que não me recordo agora – penso em Cazuza, mas não consigo ater-me se foi uma citação usada por ele ou dele – usou uma expressão que em suma afirma que amigos não se conquistam, reconhecem-se. E debaixo da chuva que me fazia meio doente (rs), fui jogado contra uma parede de verdades, minhas, mas verdades, que me fazem escrever agora.

O que caracteriza um amigo? O que o diferencia de um não amigo? Um não amigo é um inimigo? Amigo é pra sempre? E o sempre? É pra sempre?

Não, não existem verdades para tantas perguntas. Podem, sim, existir pensamentos e conclusões íntimas para quem as questiona. Talvez essas verdades sejam suficientes, talvez todos estejam conformados com elas para não ter que buscar outras que possam não ser tão suaves, ou ainda seja preguiça, afinal para que questionar uma dita verdade que se faz senso comum?

Mas, verdades a parte, voltemos ao tema sobre o qual resolvi escrever.

Deparei-me com uma situação a qual jamais poderia imaginar, ou poderia, de qualquer forma não imaginei. Um amigo, ao menos o considerava assim, que se dizia conhecer a pessoa que agora escreve, com seus inúmeros defeitos e alguma qualidade, descarregou um caminhão de ofensas e balbucios sem nenhuma preocupação e/ou sutileza. Embriagado pela raiva, companheira fiel do orgulho e sempre a espera de momentos de descontrole, não mediu esforços para machucar quem tanto dizia gostar. Enfim me perguntei: seria esse o comportamento de um amigo?

Não pretendo expor o caso a estudo, muito menos justificar ou livrar-me de culpa, não é um julgamento e a ninguém cabe o posto de juiz, réu e/ou júri. Apenas a idéia do fato explica a escolha do assunto.

Feita a pergunta por incontáveis vezes, deparei-me com outra vilã: a expectativa. Talvez a minha maior decepção não tenha sido a sua reação, mas a expectativa não correspondida da imagem criada por mim, dele. Parece um pouco complicado e até um pouco confuso, pra não dizer neurótico, mas não chega a tanto. O que foi ferido não foi tão gravemente o eu que havia sido destratado, mas o íntimo que esperava uma reação diferente, igual a minha numa possibilidade inversa, contudo uma diferente da que ocorreu.

Esse fato martelou a minha inquieta e questionadora consciência a respeito de quantas expectativas eu tinha, ou se tinha, criado a respeito de tantos outros como ele. E sim, havia muitas e absurdas.

Fiquei a pensar o quanto seria traumatizante se todos eles resolvessem agir diferente do que eu esperava, nossa, deveria suicidar-me (rs).

Porém, o que mais me enlouquecia nesse emaranhado de pensamentos – o qual deve estar enlouquecendo você que lê – era como essas pessoas ocuparam o posto de amigos e o que fizeram para isso.

Nada.

Absolutamente nada.

Posso conseguir explicações para cada uma delas. Estórias lindas, divertidas, pornográficas, cômicas, mas nenhuma delas justificaria a amizade. Qual a necessidade de justificar algo que não precisa ser justificado? Mantemos alguém por perto quando esse mesmo alguém nos faz bem. Apesar de algum outro pensador ter dito para mantermos os inimigos mais perto o quanto pudesse, são os amigos que colocamos ali no posto de guarda da nossa vida.

Podemos dividi-los em grupos, categorias, tipos, chamem como quiser. Há aqueles amigos de farra, sempre conosco em todas as bagunças, bebedeiras, esquemas. Há os conselheiros, não nos vemos sempre, mas, com certeza, sempre têm algo muito profundo a ser dito num momento difícil. Há os do trabalho, horário de expediente, talvez até um happy hour, mas não muito além disso. Sim, claro, os amigos dos estudos, colégio/faculdade, sempre na mesma “panelinha”, livrando um que não contribuiu para a tarefa em grupo, mas não merece ficar com zero. Não podemos esquecer os amigos de infância, com quem dividimos um mundo de fantasia, de descobertas e, agora, de lembranças saudosas. E, por fim, o famoso “amigo do peito”, também chamado de “amigo irmão”, aquele que dizemos que será amizade eterna, que estava conosco em nossos maiores porres, em nossas revoltas com a vida, quando conseguimos algo que tanto desejamos, que será nosso (a) padrinho/madrinha de casamento e/ou de nossos filhos, alguém que sempre podemos contar.

Todos eles têm seu espaço, nós os oferecemos e sem cobrar por isso. Apesar de poder defini-los ou classificá-los, nunca os diferenciamos, serão sempre parte de nós, pois amizade é troca, não importa o tempo que dure. Propusemos-nos a isso, receber do outro e dar de nós, sem maiores intenções. Decepcionamos-nos simplesmente por exigir a única coisa que não poderíamos ter: perfeição.

Amigos, apesar de serem nossos super-heróis por diversas vezes, são humanos, homens, errôneos e têm esse direito. Descobrir isso pode ser chocante, mas, também, se faz libertador. A amizade pode não durar para toda a eternidade, contudo estará registrada em nossas atitudes, pensamentos, personalidades e visão de quem somos e, principalmente, do amigo que somos.

A você meu amigo, meu muito obrigado.

Alexandre Rodrigues

3 comentários:

George BOMBOM disse...

Muito bom!
Não o que esse amigo deve ter feito , mas a possibilidade que ele te deu de expor esse texto/definição sobre amigos.
Parabéns

Unknown disse...

adorei!

Nuriko disse...

Conheço muita gente, e naturalmente nem todos são amigos. Mas posso garantir que a maior sorte em minha vida foram essas pessoas que conheci e que se tornaram meus amigos. Pode até parecer clichê, mas o efeito dessa amizade... Ulálá!
Com alguns já discordei bastante, discutimos e até nos magoamos sem querer. Mas isso acontece em qualquer relacionamento, não é?
Não lembro de quem era, mas certa vez li em um lugar uma frase que dizia "só aos nossos amigos é dado o espetáculo de nossa miséria", e é verdade. Amizade é para dividir tanto o que faz bem quando o que faz mal.
Mas também é preciso cuidar do outro. Por isso me irrita profundamente quem trata o amigo como saco de pancadas. Não, as coisas não são assim!

Uma vez meu pai foi me buscar em algum lugar – não tenho muito contato com ele ou com o lado paterno da família – e eu estava contando a ele que eu daria a vida, caso fosse necessário, por alguns de meus amigos. Ele ficou surpreso, e perguntou se eu daria a vida por ele. Cogitei mentir, mas em parte eu não queria e em parte não conseguia. Respondi "não". Posso ter sido frio, talvez tenha até sido cruel. Mas isso não importa agora, o que importa é: amigos são valiosíssimos, e com eles nunca estamos sozinhos – ao menos não tão sozinhos quanto imaginamos.