quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Sexo: Conversa de gente grande

Quem acha que só adultos falam de sexo se engana. Os adolescentes também falam e fazem.


Conversa 1: Alexandre Rodrigues - Posso te fazer algumas perguntas? Preciso mesmo de material para o meu trabalho; sa_gatinha - O que você quer saber?; AR - Tem que idade?; sa_gatinha – 17; AR – Onde reside?; sa_gatinha – São Paulo; AR – Você já possui vida sexual ativa?; sa_gatinha – Já; AR – E com que idade foi sua primeira experiência?; sa_gatinha – Com 15 anos; AR – E os seus pais sabem?; sa_gatinha – Ainda não; AR - Então creio que sexo não seja um assunto bem tratado em casa correto?; sa_gatinha - A minha mãe só fala pra eu me previnir; AR - Mas não conversa sobre sexo, muito menos procura saber da sua vida sexual, é isso?; sa_gatinha – É.
Conversa 2: AR - Podemos conversar?; gatinho_msn – Sobre qual assunto?; AR – Sexualidade Juvenil; gatinho_msn - Você vai fazer as perguntas?; AR – Isso; gatinho_msn – Pode fazer; AR – Você tem que idade?; gatinho_msn – 15; AR – Onde reside?; gatinho_msn – Santa Cruz, Pernambuco; AR – Já possui vida sexual ativa?; gatinho_msn – Ainda não, mas estou no caminho; AR – Poderia me definir a expressão “no caminho”?; gatinho_msn - Estou "ficando" e como você sabe às vezes acontece e às vezes não; AR – Então você ainda não transou “oficialmente”, mas já teve alguma experiência sexual? Refiro-me a sexo oral ou possibilidades similares?; gatinho_msn – Não transei e nem tive qualquer experiência, mas tenho amigos que já tiveram; AR - Entendo, e o fato de seus amigos já terem tido, de alguma forma, te pressiona para que as tenha também?; gatinho_msn - Às vezes sim, pois nas rodinhas de amigos na maioria das vezes só se fala nisso e o cara não ter nada para falar fica complicado; AR – Você e/ou seus amigos conversam com os pais a respeito de sexo?; gatinho_msn - Meus pais sempre tiveram um diálogo comigo, principalmente, a respeito de sexo; AR - Sabia que isso não acontece com todo mundo? Seus amigos também conversam com os pais deles?; gatinho_msn – Sim. Eu sei que isso é para poucos e a maioria de meus amigos não tem esse dialogo com os pais; AR – Você acredita que se os pais tratassem com mais naturalidade o assunto sexo o número de adolescentes grávidas e/ou com DST´s diminuiria?; gatinho-msn - Diminuiria e muito, pois se os pais tivessem o dialogo os jovens não procurariam os amigos para tirar suas dúvidas, afinal são os pais que eles levam a serio; AR - Você conseguiria me definir, para você, o que é sexo?; gatinho_msn – Uma fase da vida.

A realidade da maioria dos adolescentes brasileiros, como mostram os diálogos que percorrem essa página, é recheada de informação e facilidade no acesso a conteúdos variados. Entretanto, o direcionamento educacional e familiar não é proporcional ao volume de informações quando o assunto em questão é sexo. Os diálogos acima foram transcritos de uma sala de bate-papo, na qual não existe nenhum tipo de vínculo entre as partes envolvidas.
Segundo pesquisa realizada no primeiro semestre desse ano com alunos de 270 escolas particulares brasileiras, pelo Portal Educacional, entidade responsável pela aplicação dos questionários, dos 1.383 jovens que participaram 25% tiveram a primeira relação sexual aos 14 anos, 19% responderam que tiveram a experiência com pelo menos cinco parceiros e 22% afirmaram ter perdido a virgindade até os 16 anos. Mais: 14% já fizeram sexo com alguém que conheceram pela internet e 42,3% acharam ter engravidado alguém, no caso dos meninos, ou ter ficado grávida, no caso das meninas.
Os fatores que levam ao aumento desses dados de maneira agressiva não foram diagnosticados ainda, mas especialistas já indicam possíveis culpados, ou agravantes, para esta situação. A psicóloga Cristiane Vieira, formada pela faculdade Ruy Barbosa, aponta as mídias audiovisuais como excitadoras do público juvenil para o ato sexual. Segundo ela, “a mídia passa uma visão às vezes romântica e irreal da iniciação sexual, dificilmente existe o apelo do uso do preservativo e as conseqüências do seu não uso, e sim do quão mulher, feminina se sente a adolescente e o quão viril se sente o adolescente. Mostram-se jovens belos que tem uma sexualidade livre, aberta, e sem responsabilidade, o apelo ao exercício da sexualidade é crescente, é só olhar as novelas, os filmes, as séries americanas”.
Teorias à parte, o fator concreto para essa demanda de jovens irresponsavelmente ativos no que diz respeito à vida sexual não se dá pela falta de informação, pois esta existe, mas, sim, pela falta de naturalidade com que o assunto é tratado em ambientes ditos “convencionais”, como o familiar e o escolar. Quando se fala em educação sexual, vêm à tona os preconceitos que permeiam a vida de muitos indivíduos fazendo desse um assunto praticamente incabível para uma conversa a se ter com filhos. A falta de diálogo leva o jovem a sanar suas inúmeras dúvidas com amigos, sites de conteúdo adulto, ou qualquer outro meio que, ao invés de esclarecê-lo, o pressionará a testar esses conhecimentos na prática, é o que afirma Cristiane.

Síndrome do “meu chefe mandou”

Além da falta de comunicação, entra em cena uma outra perspectiva um tanto quanto delicada: o convívio em um grupo social, que para os meninos a pressão é ainda maior. Remetendo à idéia da brincadeira “meu chefe mandou”, comum na infância dos, hoje, adultos, em que uma criança era escolhida e considerada o chefe e os demais eram encarregados de copiar tudo que ele fizesse. É assim, também, em um grupo de amigos, no qual aquele que primeiro perdeu a virgindade ou tem uma vida sexual mais ativa entre eles é idolatrado pelos companheiros e transforma-se numa espécie de exemplo a ser seguido pelos demais. Todo esse endeusamento já é comum até por um fator histórico, no qual a imagem de virilidade sempre fora atribuída ao homem fértil, ao garanhão e, usando os termos atuais, o “pegador”. Já entre as meninas, toda a construção histórica da mulher, símbolo da feminilidade, da doçura, vem dando lugar a sensualidade e independência trazida pelo feminismo. As meninas que, antes, tratavam a virgindade como um troféu a ser carregado até a noite de núpcias, hoje igualam-se aos meninos diante de uma vida sexual agitada e com grande número de parceiros. Entre elas, também, há a figura forte, representada pela mais ativa sexualmente, porém, mais atuante do que a idolatria, é a censura contra as que se mantêm virgens por um tempo maior do que, pra elas, considerado normal (idade essa entre os 15 e os 17 anos).
Para Cristiane, “existe hoje uma liberação sexual mais intensa do que há alguns anos. Atualmente, os jovens iniciam sua vida sexual pra se sentirem aceitos dentro do seu grupo social. A curiosidade sobre a sexualidade, que é inata do humano, tem hoje uma situação mais favorável para ser vivenciada, pois não há mais uma preocupação com a virgindade feminina, sendo esta até ridicularizada algumas vezes”.
E vilões não faltam para creditar ainda mais tensão nessa luta contra uma vida sexual monótona. Em chats, a qualquer hora do dia é possível encontrar um enorme contingente de jovens distribuídos em salas de conteúdos que vão desde a localidade onde moram, passando por faixa etária desejada, até ambientes nos quais é possível alem de conversar ver fotos e vídeos de conteúdo adulto. Os nicks (apelidos usados como identificações) são dos mais variados, alguns singelos, outros pornográficos que se encontram por todo tipo de assunto em comum, e o mais comum deles: sexo.

Naturalidade

Diante de tantos instrumentos contra uma vida sexual saudável para os jovens, a pergunta seria: o que fazer para impedir toda essa mobilização a favor do sexo na adolescente? A resposta é simples: nada. Baseado no depoimento de especialistas, não há nada que possa impedir os jovens de terem uma vida sexual ativa, independentemente da idade que ela comece. Proibir não seria uma opção cabível, afinal durante muito tempo o sexo foi decretado como pecado pela Igreja Católica e nem isso conteve o avanço e a liberdade sexual que hoje é presenciada. Então, descartada a possibilidade da proibição e de tratar todo essa sexualidade exacerbada como algo vergonhoso ou mesmo um tabu, especialistas orientam os pais e educadores a tratar de sexo como algo comum.
Contudo, é difícil para alguém que não foi educado sexualmente pensar em conversar com o filho a respeito de sexo. A informação, apenas, é muito pouco, saber que tem que usar pra evitar doenças e gravidez indesejada não são artifícios suficientes. O jovem tem uma tendência a buscar o prazer imediato, além disso, os mitos sobre o uso do preservativo entre os grupos jovens são muito fortes. Acredita-se em situações irreais como transar com preservativo se assemelha a chupar bala com papel, ou a possibilidade de perder a ereção na colocação do preservativo, entre outros, dificulta o uso deste e se opta pelo risco, afinal de contas este também gera uma adrenalina muito bem vinda entre os jovens.
O adolescente Rodrigo, hoje com 17 anos, teve sua primeira experiência aos 14, por sentir-se pressionado pelos companheiros que já haviam perdido a tão temida virgindade tardia. Ele confessa a falta que sente de um diálogo dentro de casa e ainda acrescenta que devido a esse fator troca informações a respeito do tema com amigos e com desconhecidos na internet. Ainda acrescenta que a maioria dos seus amigos não usa camisinha com a desculpa de que ela diminui o prazer, além de assumir o não uso do preservativo em algumas transas e que contou com a sorte como fator decisivo para o risco de gravidez e contaminação por meio de doenças sexualmente transmissíveis, mesmo tendo consciência dos mesmos. “Os pais devem se mostrar abertos para falar com seus filhos sobre qualquer assunto, colocarem-se disponíveis a tirar duvidas de forma madura e sem mentiras”, ressalta Cristiane. Ela acrescenta que dizer que sexo não é bom e faz mal é uma mentira, mas têm que ser esclarecidos os riscos de um sexo inseguro e promiscuo. Segundo ela, os pais devem entender que sexo e sexualidade fazem parte da rotina de seus filhos jovens ou adolescentes e que não adianta fingir que isso não acontece. Falar sobre isso sem rodeios, abertamente, expondo os prós e contras do início precoce de uma iniciação sexual. “Importante também é não antecipar as informações, esperar que esse filho venha e questione, por isso a importância de se mostrar aberto a conversar com os filhos sem pudores e julgamentos, abrindo a porta do diálogo na relação pai-filho”, aconselha Cristiane.

Alexandre Rodrigues

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Educação Cultural: o desafio do novo milênio

Dos desenhos em cavernas à contemporaneidade a arte acompanha a história do homem. No entanto, o reconhecimento e apreciação da mesma enquanto forma de expressão, enquanto comunicação ainda é algo excluído da vida diária dos baianos.
Com impressionante diversidade cultural e apesar dos avanços, a Bahia ainda não consegue fazer do hábito de interagir com a arte algo comum. Um dos agravantes de toda essa resistência é a falta de educação e estímulo para que esse distanciamento seja aos poucos vencido.
Não se pode considerar a falta de atrações do tipo na capital soteropolitana, pois nessa as opções são muitas, porém o que não corresponde à proporção é o público. Teatros quase vazios, com público considerável, ou na melhor das hipóteses “quase” cheio, essa é a realidade com a qual os artistas convivem em sua maioria. Segundo Daniel Moreno, estudante de medicina da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e integrante de um grupo independente de teatro, “a falta de abertura da mídia para a divulgação e a dificuldade em encontrar patrocínios e apoios, já que é muito caro montar e colocar um espetáculo em cartaz, são alguns dos agravantes para o desinteresse do próprio espectador”.
Um fato relevante para todo esse entendimento da falta de interesse dos baianos por arte, é a não educação para esse tipo de expressão. Durante toda a vida escolar uma criança é obrigada a conviver com a matemática, a física, a história, e tantas outras matérias que compõem a grade fixa de qualquer estabelecimento de ensino, mas por que não acostuma-la e/ou incentiva-la a apreciar a arte?
Dentre tantas matérias obrigatórias no currículo escolar, muito poucas instituições reservam espaço para algo que se aproxime do conceito de Educação artística, e quando o fazem limitam-se a reduzi-la a pinturas, desenhos e maquetes. Segundo a Marta Sabath, Psicóloga e Licenciada em Dança, “as escolas deveriam reservar um momento para levar os alunos ao teatro, a espetáculos de dança, fazer com quem eles vivenciassem isso para que isso se torne habitual”. Ela ainda afirma que “não só a escola, mas tem que fazer parte da rotina da família levar os filhos ao teatro, educação vêm de casa, não necessariamente as crianças vão gostar ou querer aquilo, mas se de duzentas, dez gostarem e quiserem voltar isso é uma vitória”.
Todo esse conceito de educar através da arte, tem tido seu pontapé inicial e sua realização mais concreta através de instituições sociais que usam esse principio como subsídios para o resgate de crianças marginalizadas. Entre muitas instituições está o Projeto Axé.
Fundado em 1990, pelo florentino Cesare de Florio La Rocca, educador e advogado, nasce em Salvador um projeto que já vinha sendo pensado e estruturado cinco anos antes, o Projeto AXÉ. Incentivado pela organização italiana não governamental de cooperação internacional, Terra Nuova, e pelo Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua e com clara atuação política e pedagógica, instala-se com o objetivo de resgatar crianças e adolescentes que vivem nas ruas, ou filhos da exclusão, como os denomina Cesare, dando-lhes educação de qualidade.
O projeto, que atende hoje aproximadamente 1.500 crianças e adolescentes, começa nas ruas, nas chamadas Escola a Céu aberto, onde educadores instruídos fazem um trabalho de conscientização e estímulo para seduzi-las. Segundo Caubi Nova, professor de História que trabalha como Assessor e Educador Popular do AXÉ, “o intuito é fazer com que essas crianças queiram vir para o AXÉ, não que sejam trazidas, mas que venham por elas mesmas”.
Incluídas efetivamente no projeto, essas crianças são dividas em grupos de acordo com suas necessidades e idade. Crianças entre 4 e 11 anos são encaminhadas para o Canteiro dos Desejos, espaço pedagógico que trabalha o lúdico, o imaginário e a cultura infantil tentando viabilizar a contemplação das diversas áreas do conhecimento. Jovens com idade superior a 11 anos são encaminhados a uma das Unidades Educacionais do Pelourinho, Unidade de Dança e Capoeira e Unidades de Profissionalização que atendem jovens de 12 a 18 anos, para a qual o projeto disponibiliza oficinas e companhias. Dentre elas está a Usina da Dança, que engloba a Escola de Dança Gicá e a Cia. Jovem de Dança, e trabalha com uma ampla visão cultural levando em consideração as manifestações expressivas das vidas e experiências vivenciadas pelas crianças. Destacando a cultua local e das manifestações étnicas universais, preocupa-se com a coerência dos seus conceitos éticos e estéticos e não apenas com a performance técnica interpretativa. Da mesma forma atua a oficina de Teatro, em parceira com o Teatro XVIII, no qual se apresentam espetáculos do projeto, e a oficina de Música, denominada Casa dos Sons (Canto Coral e Individual, Capoeira, Instrumentos Musicais e BANDAXÉ), que conta com o apoio indireto de artistas baianos como Caetano Veloso e Gilberto Gil, que cedem espaços em seus shows para apresentação do grupo percursivo do AXÉ. Como pré-requisito, é obrigatório fazer parte da oficina de capoeira pelo tempo mínimo de um ano, como incentivo ao conhecimento e contato da cultura popular local.
Jovens com idade a partir de 16 e limite de 24 anos são incluídos no campo de trabalho em uma das Empresas Educativas (Modaxé, Stampaxé, Casaxé e Opaxé), onde vivenciarão desde a formação e construção de um pensamento e visão mercadológica do mundo atual, até a criação e confecção de materiais de consumo básico, como roupas. Essas empresas visam preparar o jovem para o convívio no mercado de trabalho, além da educação para a cidadania e a construção de seus próprios projetos de vida pessoal e social, nutrindo sua consciência de direitos e deveres. Para esses jovens é disponibilizada uma bolsa auxílio de R$185,00 (cento e oitenta e cinco reais) como ajuda de custo, além de cachês dos que atuam em alguma das Cia. em apresentações municipais, nacionais e internacionais.
Educar através da cultura é fazer funcionar, assim, a teoria de que a partir da descoberta que o diálogo entre a arte e a educação e os conflitos provenientes dessa fusão, produzam estímulos cognitivos e sensoriais que são fundamentais para o entendimento da vida, que desloca os jovens de um patamar restrito e sem perspectivas, para uma percepção de que há na vida, um tempo e um espaço infinitos a serem conquistados.

Alexandre Rodrigues