quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Santo Orixá.



Bahia, terra de misturas, miscigenação, ponto de encontro de culturas e civilizações geograficamente distantes que encontraram em terras brasileiras seu ponto de fusão. Índios, europeus, africanos, com seus costumes, tradições, arquétipos sociais dividindo o mesmo espaço e, assim, sucumbindo às necessidades e dificuldades da convivência.



Dessa relação brotaram estruturas religiosas e sociais que perduram até o presente e diferenciam a Bahia dos demais continentes colonizadores/colonizados. E é sobre a adaptação religiosa que pretendo discorrer de forma superficial e pessoal partindo do pensamento lógico a partir de estudos sobre o candomblé.



Sabe-se que os negros quando aqui chegaram sofreram não só com a escravidão de seu povo, mas com inúmeras tentativas de catequização, tendo sua cultura e religião ameaçadas pelo colonizador europeu. Não pode ser desconsiderado o fato, também, de que os escravos trazidos para o Brasil eram de tribos diferentes e possuíam costumes e formatos culturais distintos, tendo que lidar com esses novos padrões sociais reestruturando sua religião e transformando-a no que conhecemos hoje como candomblé da Bahia.



Temos em nossa cultura para cada Orixá, entidade cultuada no candomblé, um referencial católico, os Santos. Essa associação não foi em vão. Na verdade foi a saída encontrada pelos escravos para cultuar os seus "deuses" sem ofender os seus senhores e o catolicismo, além de não perderem sua identidade africana.



Os orixás não possuem datas comemorativas anuais, eles são saudados de acordo com as necessidades e agradecimentos de cada tribo. Porém, durante a escravidão os negros não tinham liberdade para tais cultos, por esse motivo os arquétipos santos/orixás foram sendo aproximados pelas suas características em comum e, com isso, tiveram suas datas incluídas no calendário católico de acordo com o seu correspondente.



Entretanto, alguns orixás não tiveram associação direta, mas encontram força em lendas e determinações geográficas brasileiras, como é o caso do orixá Yemanjá. Sereia vaidosa, dona das águas salgadas e mãe de todos os orixás - esta última sendo apenas uma de suas lendas - Yemanjá firmou-se perante os pescadores, já que de muitos estados brasileiros a pesca era uma das principais formas de sustento, e de desbravadores marítimos que tinham as sereias como um dos muitos perigos dos mares, capazes de encantar os homens com seu cantos e afundar as embarcações nas quais navegavam.



Por esse motivo, a rainha dás águas salgadas assumiu traços europeus em sua imagem branca, com traços finos e trajes compostos. Convenhamos, se os orixás têm origem africana, como poderia um deles ter cor diferente do povo com quem mantêm o seu cordão umbilical?



Contudo, nem todas as divindades africanas puderam ser contempladas pela associação candomblé/catolicismo, criando um distanciamento e difícil conhecimento de tais entidades tais como: Logunedé, filho de Oxóssi, orixá das matas, e Oxum, orixá das águas doces, e que assume as características de seus pais; Ewa, entidade do canto, das coisas alegres e vivas, orixá da beleza e dos mistérios; Iroko, entidade da ancestralidade, que assume características no candomblé baiano conhecido como angola do orixá Tempo; Obá, guerreira menos vaidosa entre as entidades femininas e terceira esposa do orixá Xangô; entre muitos outros que se perderam no tempo.



Entender a diferenciação entre orixás e santos requer estudo, mente aberta para possibilidades e principalmente para um distanciamento da educação cultural que todo baiano é exposto desde seu nascimento. Somos educados para conviver com a mistura, com o naturalismo de cultos e formas diferentes, com a aproximação temporal de segmentos religiosos distintos em origens e formatações. Não se deve julgar certo ou errado a configuração atual, mas deixar de lado o comodismo de apenas aceitar o que existe para conhecer a pluralidade de uma cultura fascinante como a africana é enriquecer a mente e o espírito. Axé.



Alexandre Rodrigues